segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

A Medicina dos Novos Tempos


Dr. Guilherme Loja Kropf
O mundo tem vivido um período de rápidas mudanças. A tão falada globalização, os modernos meios de transporte, alimentos agora "transgênicos", novas profissões, nova concepção de casamento e família, enfim, quase tudo que diz respeito à maneira dos seres humanos se comportarem neste planeta tem estado em contínua modificação nesses novos tempos. Conseqüentemente, a humanidade se vê obrigada a viver em constante readaptação, algo que no passado era mais sutil, pois as mudanças levavam varias gerações para se efetivar. Chegamos ao ponto onde o computador tem deixado de ser artigo opcional e vem se transformando em instrumento de necessidade, impondo uma nova velocidade a todos os eventos, tal como aconteceu há alguns anos com o telefone, a energia elétrica e o automóvel.
A medicina permaneceu praticamente inalterada desde os seus primórdios até o inicio do século 20, no que diz respeito aos recursos. Só nesta época por exemplo, se começou a dominar a transfusão sanguínea para evitar a morte por hemorragia de parto. Na primeira metade deste século, de carona com os progressos da física, química e biologia, pode experimentar um importante, embora lento, desenvolvimento. Surgem os antibióticos, as vacinas, aprimoram-se as técnicas de assepsia, cirurgia e anestesia.
Porém, as últimas duas ou três décadas têm sido palco de um verdadeiro furacão de novidades A tecnologia de imagens associada à informática, trouxe novos recursos tais como ressonância nuclear magnética, tomografia computadorizada helicoidal onde é possível a reconstrução radiológica seletiva do tecido ou órgão desejado, a ultra-sonografia colorida em 3 dimensões etc. Novos tratamentos genéticos, transplantes de órgãos, remédios revolucionários, cirurgias não invasivas; são tantas as novidades que dificultam a capacidade do profissional de saúde manter-se atualizado cientificamente. A cada quatro anos, o número de informações médicas dobra.
Em meio a tantas mudanças, chegam os planos de saúde, ocupando a lacuna deixada cronicamente pela medicina pública. E com eles, chegam novas regras e normas de relacionamento entre clientes e médicos, promovendo muitas e importantes modificações no atendimento e procedimento médico. De um lado o cliente, envolvido pela propaganda da "moderna medicina" oferecida na TV, e para justificar o peso mensal do plano de saúde em seu orçamento, deseja consultar vários médicos, de preferência os melhores especialistas. "Já que eu pago tanto e quase não uso, quero logo fazer todos os exames é o pensamento corrente.
Por outro lado, com o fim da clientela particular, a grande maioria da classe médica não teve alternativa a não ser trabalhar para os convênios. Muitos, aproveitando a demanda que o desenvolvimento científico acelerado proporcionou, investiram em aparelhos sofisticados, criando assim, novas especialidades que não existiam no passado como endoscopistas hemodinamicistas e outros. "O procedimento é moderno, eu necessito pagar o aparelho importado, os clientes desejam se submeter, os convênios pagam, então vamos lá !!!" E com tantos e tão caros exames a pagar, sobram, por parte dos convênios e cooperativas médicas, poucos recursos para remunerar o mais importante e característico ato da história da medicina: a consulta médica.
Muitos profissionais mantêm consultórios credenciados porque são, em última análise, a fonte geradora de exames e procedimentos específicos. Entretanto o clínico geral – que tem a consulta como único evento a ser remunerado – , se vê obrigado a ser rápido, ágil e objetivo em seus encontros com os pacientes, visando apenas os sintomas emergentes. É inviável enveredar por qualquer caminho demorado na busca ou tratamento das verdadeiras e profundas causas das doenças. Deve solicitar exames complementares e encaminhá-los aos especialistas para cuidar dos aspectos específicos. É batizada pelos clientes de planos de saúde como a "consulta de convênio", na qual a anamnese e o exame físico detalhado ficam somente para os casos mais graves.
Um estudo mostrou que, no momento atual, uma consulta vale pouco mais que um corte de cabelo (que por sinal é pago à vista) e o médico generalista, para manter uma família de 2 filhos, de classe média, um consultório com suas despesas inerentes ( secretária, impostos, telefone, condomínio etc.) e ter um mínimo de atualização ( livros, cursos, congressos ), necessita atender diariamente 1 paciente a cada 20 minutos, 8 horas por dia sem interrupções, 5 dias na semana, e sem sofrer censuras por parte dos convênios ( que não pagam a 2ª consulta no mesmo mês.) E também sem férias, 13º salário, fundo de garantia, aposentadoria, sem o direito ao menos de quebrar o pé, quanto mais de ficar afastado do trabalho por alguma doença séria. Ou seja, deve ser uma verdadeira e infalível máquina de fazer consultas...Faz lembrar o filme Tempos Modernos de Chaplin onde o funcionário não podia se afastar ao menos um segundo da esteira rolante de trabalho em função da produção em série.
Como conseqüência de todas essas mudanças, me pergunto se, apesar de menos recursos técnicos, as consultas médicas de nossos avós não teriam maior resolutividade e abrangência na abordagem ao desequilíbrio energético causador das doenças humanas. Ganhavam em escuta, compreensão, exame físico, conhecimento da vida dos pacientes e formação de um elo de confiança na relação do doente com o SEU MÉDICO, cujo efeito benéfico e, por vezes, curativo é inegável.
Porque isto não mudou. O ser humano desde que existe sempre adoeceu e nestes momentos fica ávido de atenção, carinho, necessitando ter esperança e confiança que outro ser humano, o médico, vai se dedicar e dispor de seu conhecimento para tentar aliviar o sofrimento e orientar no sentido da saúde. A pessoa doente tende a repetir a experiência de uma criança que se machuca e procura a mãe para, pelo menos num aconchego carinhoso, "dividir" a dor. Todo mundo quer encontrar um médico calmo, que lhe escute e ampare e que tenha um mínimo de disponibilidade, sem ficar olhando o relógio, preocupado com o tempo da consulta e com a sala de espera cheia.
É preocupante quando o imediatismo ocupa o espaço do raciocínio clínico. Recentemente uma senhora de 78 anos necessitou internação hospitalar por quase 10 dias. Ela tinha 3 médicos e tomava 6 medicamentos: hormônio tireoidiano (endocrinologista), 2 antiarrítimicos (cardiologista) e 3 calmantes (neurologista). A queixa principal era agitação noturna ( vestia-se às 2 horas da madrugada querendo ir a missa), desorientação e quedas frequentes. Foi observado durante a internação, que a dose do hormônio tireoidiano administrado estava muito elevada e gerava, como efeitos colaterais, todos os outros sintomas ( que estavam sendo medicados com os outros 5 remédios). Teve alta assintomática, com apenas 1 remédio/dia. E a despesa do convênio foi 10 vezes maior. Uma consulta à moda antiga talvez tivesse evitado o sofrimento da internação hospitalar
Não se pode tratar "partes da pessoa" como se substitui peças de um automóvel. A falta de visão global holística, incluindo aspectos familiares, existenciais, profissionais, espirituais e afetivos, gera procedimentos muitas vezes desnecessários e prejudiciais à saúde. Especialistas são importantes, exames novos, remédios potentes, todos são bem vindos. Devemos utilizar todas as possibilidades que a ciência oferece mas nós, médicos, pacientes e responsáveis pela direção dos convênios, devemos estar atentos para preservar a energia que permeia a relação durante uma consulta médica. Devemos enxergá-la, valorizá-la e remunerá-la como o evento mais importante do exercício da medicina, e que detém o poder de traçar o caminho mais curto, mais seguro e mais barato para o restabelecimento e preservação do estado de saúde. A tecnologia não pode afastar a face humana do encontro médico-paciente.
Quem tem 1 médico tem 1.
Quem tem 2 médicos, tem meio.
Quem tem 3 médicos, não tem nenhum.

Guilherme Loja Kropf – Médico e homeopata.
Clínico geral do Hospital Evangélico RJ
FONTE: http://www.fw2.com.br/clientes/artesdecura/

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